Extinção de pena com imóvel em pagamento
Por Graciela Ribeiro / Artigos
Efeitos penais da dação em pagamento (Portaria PGFN 32/2018)
O escopo da Portaria PGFN 32, de 8 de fevereiro de 2018 é regulamentar o procedimento da dação em pagamento de bem imóveis para extinção de débitos, de natureza tributária, inscritos na dívida ativa da União.
O racional da política-criminal tributária que confere extinção da punibilidade (penal) ao pagamento (tributário) é do prêmio ao acusado que restitui o status quo ante pela via da reparação à vítima (no caso, o erário público).
Em que pese a norma ser muito mais generosa do que a reparação do furtador (que só obterá redução da pena de 1/3 a 2/3, conforme artigo 16 do Código Penal), o Código Penal já conhece, há tempos, a extinção da punibilidade no delito de peculato culposo, quando há reparação do dano antes de sentença irrecorrível (artigo 312).
A leitura da Portaria PGFN 32/2018 — e não poderia ser diferente, considerando o instituto da dação em pagamento — deixa claríssimo que a reparação do dano (para usar o jargão penal) há de ser integral:
“Art. 2º A dação em pagamento de bens imóveis deve abranger a totalidade do débito que se pretende liquidar, com atualização, juros, multa e encargos legais, sem desconto de qualquer natureza, assegurando-se ao devedor a possibilidade de complementação em dinheiro de eventual diferença entre o valor da totalidade da dívida e o valor do bem ofertado”.
Além disso, havendo ainda controvérsia judicial em relação ao crédito, é condição que o contribuinte desista das ações, caso queira valer-se da dação (conforme artigo 4º).
Por todos os ângulos, a dação em pagamento tem a mesma funcionalidade do pagamento para fins de política-criminal tributária, de sorte que a aplicação da analogia favor rei é de rigor, ou seja, obtida a dação em pagamento, a extinção da punibilidade tem de se operar.
Resta, ainda, a questão do marco temporal: até quando a dação aproveita o cidadão para fins penais? O recebimento da denúncia ainda é decisivo?
A Súmula Vinculante 24 — que condiciona a atuação do Estado-penal ao esgotamento da via tributária, nos crimes materiais — afastou o velho dilema do contribuinte “recorrer no tributário e arriscar ser denunciado, no criminal” versus “pagar o tributo para não ter risco criminal, mesmo não concordando com o lançamento”.
Desde então, portanto, o marco do recebimento da denúncia faria sentido.
A Lei do Salário Mínimo, de 2012, engravidada de normais que pretendiam regular a assunto, criou um imbróglio, alterando leis que já não vigiam.
Já sob a vigência da referia lei, o STF reafirmava entendimento de que o pagamento a qualquer tempo levaria à extinção da punibilidade (APN 450/MG, rel. Teori Zavascki); também o STJ ainda considera a Lei 10.684/2003 como a lei de vigência e adota a interpretação de que “não há como se interpretar o referido dispositivo legal de outro modo, senão considerando que o pagamento do tributo, a qualquer tempo, até mesmo após o advento do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, é causa de extinção da punibilidade do acusado” (HC 362.478/SP, rel. Jorge Mussi, DJe 20/9/2017).
Claro está, portanto, que a extinção da punibilidade pode e deve ser reconhecida a qualquer tempo.
Fonte: https://www.conjur.com.br/2018-fev-15/tangerino-efeitos-penais-dacao-pagamento-portaria-pgfn-32